Novembro de 2018. Diplomação do presidente eleito Jair Bolsonaro. A cena provocativa da ministra do STF e então presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Rosa Weber, na qual presenteia o recém-eleito, com um exemplar da Constituição Federal, sinalizou o que vinha pela frente.

Diante de sorrisos jocosos e irônicos, Bolsonaro manteve a fleuma e fez um discurso apaziguador, prometendo governar para todos os brasileiros. “No calor dos acontecimentos, a gente dá umas caneladas”, afirmou o futuro chefe do Executivo, como um pedido de desculpas pelas críticas feitas durante a campanha.

Mas a pacificação não veio.

O recado da Corte de que não toleraria qualquer ato de Bolsonaro à margem da Carta Maior teve destinatário equivocado. Em três anos de mandato, o presidente não saiu das quatro linhas do texto constitucional. Já, ironicamente, os iluminados têm tomado decisões políticas e, muitas vezes, dissociadas da Constituição Cidadã.

 

Em março de 2019, no início da gestão presidencial, o ministro Dias Toffoli abriu o famigerado e inconstitucional Inquérito das Fake News e deixou a ação a cargo de Alexandre de Moraes, contrariando posicionamento da então PGR, Raquel Dodge, a quem cabia precipuamente a iniciativa da ação penal. Outras ações governamentais foram questionadas na Corte pela oposição. Boa parte deveria morrer no nascedouro, mas decisões monocráticas cancelaram inciativas do presidente, como a extinção de Conselhos e a MP que proibia o desconto sindical, em folha de pagamento sem a autorização do trabalhador.

O caso simbólico ocorreu, em 2020, quando o STF suspendeu a indicação de Alexandre Ramagem para ao comando da Polícia Federal. A decisão violou prerrogativa privativa do Chefe do Executivo, com o apoio da imprensa e do silente Legislativo.

Na sanha de constranger Bolsonaro, os ministros também deram ultimatos ao presidente, numa verdadeira afronta à independência e harmonia entre os Poderes. Eles determinaram prazos para que o presidente explicasse declarações sobre o pai do então presidente da OAB Felipe Santa Cruz e o governador do Maranhão, Flávio Dino e apontasse o valor investido no SUS; limitou a atividade de inteligência do governo federal; quis saber sobre a presença das Forças Armadas na Amazônia e supostas ameaças à imprensa.

E o que dizer do ministro Gilmar Mendes, que a pedido de legendas oposicionistas suspendeu vetos de Bolsonaro ao projeto que exigiu o uso de máscaras, em locais públicos e privados, num escárnio ao próprio Legislativo, verdadeiro detentor da análise de vetos presidenciais? Alguma palavra para a decisão do ex-iluminado Celso de Mello, que mandou divulgar o vídeo de uma reunião ministerial e determinou perícia no celular do presidente da República? E como esquecer a articulação de ministros do STF, com partidos para enterrar a PEC do voto impresso, no ano passado, quando deveriam guardar posicionamentos para os autos?

No final do ano passado, o ministro Dias Toffoli e ex-advogado do PT, afirmou que o país já vive “um semipresidencialismo, com um controle de poder moderador exercido pelo STF”, citando como exemplo desse exercício inconstitucional a condução da pandemia de Covid-19.

As gambiarras legais e perturbadoras já vinham sendo feitas, desde que o ministro Ricardo Lewandowski rasgou a Constituição, em uma sessão do Senado, transmitida, ao vivo, para todo o país ao manter os direitos políticos da impichada Dilma Vana Rousseff.

Melhor seria a ministra Rosa Weber pedir de volta o exemplar da Constituição. Quem sabe, assim, eles poderão se debruçar sob a Magna-carta, com mais desvelo e respeito.

 

By Mércia Maciel, jornalista e pedagoga, formada pela Universidade de Brasília.

 

Cover Image by Gerd Altmann from Pixabay

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